10 anos de Lei Seca. O que mudou?

Em junho de 2008 foi sancionada a Lei Federal n° 11.705, conhecida popularmente como “Lei Seca”, cujo objetivo, entre outros assuntos, era aplicar a “tolerância zero” quando o assunto é dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.

Com a entrada em vigor da referida lei, os debates sobre o tema se eclodiram na classe jurídica brasileira. Afinal, o cidadão é obrigado a realizar o teste do bafômetro? Quais as consequências de fazer ou não fazer tal procedimento?
Diante desses e outros questionamentos, surgiram pelo menos duas correntes: uns defendem o direito de não autoincriminação (visto que ninguém pode ser obrigado a produzir prova contra si); outros defendem o interesse público e a segurança da coletividade, tendo em vista os conhecidos e alarmantes índices de acidentes com vítimas fatais, envolvendo motoristas sob efeito de álcool.

Importante mencionar, inicialmente, que este ano comemora-se uma década da entrada em vigor da Lei Seca, mas inúmeras mudanças na legislação ocorreram desde então. Por esse motivo, oportuno apresentar um breve histórico antes de aprofundar o tema:

  • 19 de junho de 2008 – É promulgada a Lei Seca, alterando o Código de Trânsito Brasileiro para a “tolerância zero”. Passou-se a não admitir mais a concentração de seis decigramas de álcool por litro de sangue para que o condutor fosse considerado impedido de dirigir. A partir desse momento, qualquer concentração de álcool por litro de sangue sujeitava o condutor às penalidades legais.
  • 20 de dezembro de 2012 – É promulgada a Lei n° 12.760 que alterou novamente o CTB, aplicando como penalidade por dirigir sob influência de álcool de cinco para dez vezes o valor da multa, além da suspensão do direito de dirigir por 12 meses.
  • 04 de dezembro de 2014 – DENATRAN altera a Portaria n° 59/2007, alterando a penalidade por se recusar a realizar o teste do bafômetro para gravíssima e multa de dez vezes.
  • Em 2016, com o advento da Lei n° 13.281, acrescentou o art. 165-A no Código de Trânsito Brasileiro para punir também o condutor que se recusa a realizar o teste do bafômetro.

Essa última alteração legislativa se deu justamente pelo debate jurídico mencionado anteriormente, referente à proibição de se exigir de alguém a produção de prova contra si. Dessa forma, o legislador encontrou uma forma de não obrigar o condutor a se submeter ao teste do bafômetro, mas puni-lo de modo a desencorajar tal atitude. Para tanto, aumentou e equiparou a pena pela recusa de se submeter ao teste do bafômetro às infrações por direção sob efeito de álcool.

Em outras palavras, as penas pecuniárias e administrativas para direção sob efeito de álcool ou recusa a realizar o teste do bafômetro são exatamente as mesmas para as duas condutas: multa de R$2.934,00, suspensão da CNH por até 12 meses e retenção do veículo.

E aí vem a pergunta: se a pena imposta por dirigir alcoolizado e se recursar a fazer o teste é exatamente a mesma, qual o motivo de se recusar a fazê-lo?

A resposta é simples: conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência é crime e está disposto no art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro.

Portanto, estando o condutor sob efeito do álcool, pode ser determinada sua prisão em flagrante. Contudo, por outro lado, não há crime algum se recusar a realizar o teste do bafômetro.

Engana-se, no entanto, quem pensa ser possível dirigir sob efeito de álcool e evitar a prisão com a simples recusa de se submeter ao teste do bafômetro.

O mesmo art. 306 dispõe que a conduta pode ser constatada por teste do bafômetro (6 decigramas de álcool por litro de sangue ou pelo menos 0,3 miligramas de álcool por litro de ar alveolar) ou por sinais que indiquem a capacidade psicomotora, podendo ser obtida através de exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de provas em direito admitidos.

Ou seja, supondo que ao ser parado em uma blitz o condutor se recuse a fazer o teste do bafômetro, mas está visivelmente alcoolizado, ele pode ser punido pelo crime do art. 306, mesmo sem realizar o teste do bafômetro, se comprovado, por prova testemunhal por exemplo, que estava embriagado.

No entanto, também apenas a título de exemplo didático, um policial que encontra na blitz seu desafeto e, para se vingar, acusa o condutor de direção sob efeito de álcool, mesmo sabendo que o motorista não estava. Cabe aqui ao condutor elaborar uma contraprova, podendo, por exemplo, exigir que se realize o teste do bafômetro ou, se não houver, pode se submeter a exames clínicos para comprovar a não ingestão de bebidas alcóolicas.

Em resumo, eis as seguintes possibilidades:

  • Condutor se recusa a fazer o teste do bafômetro OU realizar o teste e constatar até 0,3mg de álcool por litro de ar expelido.
    • Multa de R$2.934,00;
    • Suspensão da CNH por doze meses;
    • Retenção do veículo.

  • Condutor realizou o teste do bafômetro e se constatou acima de 0,3 mg de álcool por litro de ar expelido:
    • Multa de R$2.934,00;
    • Suspensão da CNH por doze meses;
    • Retenção do veículo
    • Detenção de 6 meses a 3 anos

 

FUI PEGO NA BLITZ, TENHO DIREITO À DEFESA?

Claro. Após ser constatada a ingestão de bebida alcóolica no condutor, é lavrado o auto de infração, visando a abertura de um processo administrativo garantindo a ele o contraditório e ampla defesa.

Vale lembrar que o condutor só precisará entregar sua CNH para cumprir a suspensão após esgotados todos os recursos no processo de suspensão, como por exemplo a defesa prévia, recurso em primeira instância e recurso em segunda instância.

Por fim, imperioso destacar que este artigo tem apenas o cunho jurídico e visa tão somente esclarecer a abrangência legal sobre o tema e jamais, direta ou indiretamente, incentiva a condução de veículos sob efeito de qualquer substância psicoativa. Mesmo porque, importante deixar claro, dirigir sob efeito dessas substâncias é crime, conforme art. 306 do CTB, independente do desfecho no caso concreto.

@koericheoliveira

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